A abordagem desse artigo deve-se ao facto de várias
pessoas e entidades terem solicitado ao nosso blogue uma análise ou parecer sobre as promessas
para o sector energético contidas nos programas eleitorais do MPLA.
Essa análise foi feita tendo em conta também algumas inquietações,
dúvidas e perguntas formuladas pelos nossos seguidores, entidades afins e
alguns debates no Facebook durante a campanha eleitoral. Durante esses debates
sempre considerei que a proposta de produzir 5000 megawatts (MW) de energia em 2016 era
equivalente a proposta feita em 2008, de se construir um milhão de fogos
habitacionais em 2012.
Promessas de 2008 no domínio da energia
a) - Assegurar o acesso a electricidade a cerca de 100% da
população das áreas urbanas, a 60% das zonas peri-urbanas e a 30% das zonas rurais
de todas as províncias.
Realidade no fornecimento de energia só em Luanda:
“Luanda precisa de 700 megawatts (MW), de acordo com o ex-governador
de Luanda para a área económica, Miguel Catraio, a exploração de energia até
este ano era feita com um deficit de 47%, ou seja em Luanda, em média, está
diariamente disponível, no período das 8 horas a meia-noite, 310 megawatts. A
situação agrava-se a partir da meia-noite, período em que estão disponíveis
apenas 247 megawatts, sendo que no resto do país a situação é pior”.
Promessas de 2012
b) - Gerar 1500 megawatts de energia até 2014, de um total
de 5000 megawatts até 2016.
c) - Instalar sistemas públicos de abastecimento de
energia em 82 sedes municipais, das 166 existentes, e em 271 sedes comunais, de
um total de 531, até final de 2014.
d) - Operacionalizar 30 megawatts de capacidade gerada a
partir de pequenas centrais hídricas, de um total de 130 megawatts a atingir
até final da década.
Análise:
1- Olhando para os pontos do Programa anterior e tendo em
conta o crescimento exponencial da demanda pela energia eléctrica, versos a
oferta, acha que os pontos acima referidos são exequíveis dentro horizonte
temporal definido?
Infelizmente, o MPLA no seu programa para 2012-2017 não
apresenta o balanço do cumprimento das promessas do sector eléctrico da
legislatura passada. Contudo, podemos facilmente notar que o acesso a
electricidade a cerca de 100% da população das áreas urbanas não é um facto em
várias cidades de Angola, sem precisarmos de avançar exemplos. Isso deve-se
grandemente ao deficit de produção energética e a atrasos na conclusão dos
projectos de construção de linhas de transmissão e distribuição eléctrica
durante o mesmo período. Porem, pode-se constatar em algumas cidades e
municípios melhorias no fornecimento de energia a população.
- Operacionalizar 30 megawatts de capacidade gerada a
partir de pequenas centrais hídricas, de um total de 130 megawatts a atingir
até final da década:
Essa meta é exequível se as condições financeira, técnica
e humana forem criadas. Se olharmos para os projectos de reabilitação e
ampliação das barragens da Matala, Mabubas, Lumaum e Gove, facilmente podemos
aferir que se existirem recursos essa meta pode ser alcançada. Contudo, não
podemos perder de vista que na carteira do Ministério da Energia e Águas sempre
existiram vários projectos, cuja a sua implementação contínua dependente da
componente financeira. Esta situação me leva em crer que o país não tinha condições
de executar tantos projectos em simultâneo; Por exemplo, o adiamento dos
projectos de construção e reabilitação das barragens hidroeléctricas do leste
de Angola, como a barragem de Luachimo.
- Gerar 1500 megawatts de energia até 2014, de um total
de 5000 megawatts até 2016.
Segundo o Programa do MPLA: “ Com vista a remover o déficit
de energia eléctrica do País, está em curso a reabilitação das barragens do
Gove, Mabubas, Lomaum e Cambambe I, a concluir em 2012, e que aumentarão em
295.6 megawats a capacidade de energia eléctrica de Angola. Estes projectos,
conjugados com a implementação dos projectos estruturantes no Soyo, Cambambe,
Laúca, Caculo Cabaça e Keve a serem concluídos em 2016, e que gerarão uma
capacidade adicional de 5.000 megawatts, farão com que, a partir de 2013, o abastecimento
de energia eléctrica melhore significativamente no País e que a partir de 2017
os principais problemas do sector estejam resolvidos.” Fim de citação.
A direcção nacional
de energia do ministério de energia e águas, publicou alguns dados do sector
em 2008. Estimava-se que a produção de electricidade em 2008 era de 1.289
MW. Portanto, tendo em conta os dados apresentados no programa do MPLA, bem
como o surgimento de algumas centrais térmicas em várias províncias e a
possível conclusão de Cambambe I; posso considerar que Angola poderá possivelmente
contar com uma produção de cerca de 1500MW em 2014.
Se olharmos para os projectos mencionados acima e considerando
os dados publicados recentemente, facilmente percebe-se que as barragens de
Laúca e Caculo Cabaça não estarão concluídas em 2016.
Segundo uma publicação do jornal de Angola, a barragem de
Laúca orçada em 3,7 mil milhões de dólares será a maior barragem a ser
construída no país e terá capacidade para produzir 2.067MW de energia.
Estima-se que até ao primeiro semestre de 2016 já será possível a produção de
500MW de energia.
O ministério da energia e água tem estado a fazer estudos
para a construção das barragens de Caculo Cabaça e Keve. Estes projectos
estiveram sempre dependentes da condição financeira para a sua execução.
Durante o Conselho Consultivo Alargado do Ministério da
Energia e Águas (Minea), realizado em Agosto deste ano na cidade do Lubango,
o ministro da João Baptista Borges referiu que está em preparação o lançamento
do concurso para a construção do aproveitamento hidrográfico de Caculo Cabaça,
com 2.100MW, e a reabilitação do aproveitamento hidrográfico de Luachimo, com
32MW, na Lunda-Norte, além da construção dos projectos de Chiumbe Dala, com
12MW, na Lunda-Sul, com ligação ao Luena, dos sistemas de transporte de alta
tensão associados à central do Soyo, Cambambe II e Laúca. Contudo, o mesmo não
se pronunciou sobre o projecto Keve e o projecto das futuras centrais térmicas
do Soyo associado ao projecto Angola LNG.
Portanto, ainda existem algumas incertezas sobre a execução
de alguns projectos anunciados pelo MPLA, nomeadamente Caculo Cabaça, Soyo e
Keve.
Quando as obras de reabilitação e modernização da
barragem de Cambambe estiverem concluídas, esta vai ter uma capacidade agregada
de 960MW. Estima-se que a centra 1 e 2 produzirão 260MW e 700MW respectivamente.
Se considerarmos a produção agregada estimada para as barragens
de Cambambe II e Lúaca para o ano de 2016, teríamos um total de 1200MW.
Contudo, como os projectos de engenharia não são projectos linearmente matemáticos,
vários factores acabam sempre por afectar a sua execução, condicionando assim a
conclusão das diferentes fases nos tempos programados. Esses factores incluem
problemas de ordem ambiental e estrutural, de fabrico dos equipamentos e
materiais, comissionamento e testes de equipamentos, transporte, finanças, recursos
humanos, grandes acidentes ou incidentes, etc. Um exemplo recente foi a
reabilitação da barragem do Gove, que teve o seu iniciou em 2001 e somente em Agosto
de 2012 foi inaugurada. A barragem do Gove produz somente 60MW de energia.
Não querendo ser pessimista e ainda assim considerando
que os projectos de cambambe II e Lúaca sejam executados conforme estimativas
apresentadas, teríamos ainda a necessidade de produzir cerca de 2300MW para atingirmos a cifra de 5000MW em
2016.
O governo do MPLA precisaria de grandes recursos
financeiros para executar todos os projectos programados. Se termos em conta
que o projecto Laúca está orçado em cerca de 3.7 mil milhões de dólares,
podemos estimar que cerca de 10.5 mil milhões de dólares seriam precisos para
desenvolver as barragens hidroeléctricas. Recentemente, o Presidente do MPLA,
José Eduardo dos Santos, disse que o governo iria investir cerca de 17 mil milhões
de dólares para melhorar o sector eléctrico em Angola. Contudo, esses recursos
ainda não estão disponíveis, havendo a necessidade de se fazer recurso a algumas
linhas de crédito internacionais.
Contudo, ainda que Angola tivesse esses recursos
financeiros disponíveis, o outro handicap seria a componente dos recursos humano
e a capacidade tecnológica em desenvolver todos esses projectos em apenas 5
anos. Angola continua a depender grandemente da cooperação com empresas
estrangeiras para a execução da maior parte dos seus projectos energéticos.
Portanto, apesar de não ter dados específicos sobre os
projectos de Caculo Cabaça, Soyo e Keve, não acredito sinceramente que essa
meta seja alcançada em 2016, tendo em conta a realidade do sector eléctrico e a
experiência de Angola com os projectos de Capanda, Cambambe, Angola LNG e a
Refinaria do Lobito. Nestas condições, penso que Angola não vai poder produzir
5000MW em 2016.
- Instalar sistemas públicos de abastecimento de energia
em 82 sedes municipais, das 166 existentes, e em 271 sedes comunais, de um
total de 531, até final de 2014:
2- Que impacto poderá causar caso sejam concretizados,
ou, se for o caso, qual seria se não forem concretizados?
O grande impacto seria o aumento da qualidade de vida das
populações em algumas localidades do país, com a melhoria do sistema de
distribuição a nível da rede doméstica e de iluminação pública. Por outro lado,
aumentaríamos a disponibilidade de energia eléctrica para o desenvolvimento
industrial, diminuindo em alguns casos o recurso a fontes alternativas. Caso
contrário, vamos continuar a ter um sistema de distribuição de energia com
elevado déficit energético, ineficiente e com pouca qualidade. Não podemos
esquecer que uma boa parte das empresas que operam no país têm geradores
próprios, que utilizam em caso de perturbações no sistema eléctrico.
3- Na visão do Engenheiro, qual seria a melhor
alternativa para combater o elevado déficit de energia eléctrica?
A melhor alternativa é sempre aumentar os níveis de
produção tendo em conta as diversas fontes de energia e recursos disponíveis.
Angola é um pais rico em recursos hídricos. Se desenvolvermos os maiores
projectos das bacias do kwanza e Cunene estaremos a caminhar nesse sentido. Penso
que essa está a ser a aposta do governo, tendo em conta os projectos das
barragens do Laúca e Caculo Cabaça. Precisamos de igual modo materializar os
projectos da bacia do Cunene, os projectos
de Jamba Ia Oma, Jamba Ia Mina e Baynes, de maneira a melhorarmos a produção de
energia na região sul de Angola.
Tendo em conta a previsão do arranque para este ano do projecto
Angola LNG, devíamos começar a projectar a construção de centrais térmicas de
ciclo combinado para o município do Soyo. Se projectarmos a construção de
centrais térmicas com capacidades na ordem de 400MW estaríamos num bom caminho.
A energia solar seria também uma outra aposta para as zonas rurais e a
iluminação pública fora das localidades urbanas. Podemos igualmente criar centrais eléctricas solares e fornecer a energia produzida ao nosso sistema de linhas de transmissão eléctrica. Países como a Alemanha bateram
o recorde mundial com a produção de cerca de 20 mil megawatts hora de energia solar.
Angola encontra-se geograficamente numa posição adequada para o desenvolvimento
da energia solar.
4 - Na sua análise quanto é que Angola precisa de energia
para alimentar a economia e as famílias? Quanto é que precisa de investir em
dólares e em que áreas específicas?
Tendo em conta os planos de desenvolvimento do executivo
Angola 2025, a quem já fala em Angola 2050. Penso que precisaríamos de pelo
menos 20 mil megawatts. Lembra-se que os níveis de produção sul-africanos situam-se acima dos 40 mil megawatts, e mesmo assim já existem projectos para o
aumento da capacidade energética.
Não estou em condições de fazer uma análise económica
devido a falta de referencial em relação aos vários projectos energéticos desenvolvidos
no Pais. Se considerarmos que Capanda (520MW) custou aos cofres do estado mais
de 2,6 mil milhões de dólares e que Laúca está orçado em cerca de 3.7 mil
milhões de dólares, então podemos aferir que seriam necessários grandes
sacrifícios financeiros para alcançar tal objectivo.
Portanto, podemos concluir que temos muito trabalho a
fazer, para que a produção e distribuição de energia em Angola seja uma
realidade para todos os Angolanos.
A promessa eleitoral de energia para todos em 5 anos, feita
por todos os partidos políticos angolanos, é simplesmente falsa…